segunda-feira, 2 de abril de 2012

Opinião - Pai, por que me abandonaste?

Faz mais de dois mil anos que aquele homem, após ser traído, chicoteado e caminhar longa distância carregando uma cruz de madeira nos ombros, foi pregado a ela. Fincada a cruz o homem, minutos antes de morrer, deixou algumas palavras, na forma de uma pergunta: “Pai, por que me abandonaste?”

A Bíblia tem uma explicação lógica e provavelmente conveniente para aquela manifestação. Ele, como filho de Deus, estava na terra como homem. E quando os ladrões que foram crucificados com ele perguntaram com ironia por que, sendo filho Dele, não merecia a interferência da salvação daquele momento de sofrimento e agonia, o livro sagrado responde que Jesus, em carne, pagava naquele momento por todos os nossos pecados.

E se a manifestação Suprema não se deu naquele momento crucial, ocorreu a partir da remoção milagrosa da pesada pedra que fechava o túmulo e então com a ressurreição. Esta seria a prova de que o homem torturado e morto era mesmo filho de Deus.

Claro, aqui neste texto dou-me à permissão de ser intérprete da leitura da Bíblia. A intenção não é de transcrever literalmente o que o Livro nos diz. E ouso, embora sabendo de discordâncias de pessoas subsidiadas em anos de estudos sobre o assunto e outras nem tanto, mas apegadas a uma fé que se torna paixão, questionar: a provação na forma de tamanha violência foi em vão?

A guerra religiosa de milênios ainda perdura naqueles mesmo locais. Só que agora não são com o uso de pedras, lanças e flechas. A tecnologia permite hoje muito mais mortes num único ato. Não há mais necessidade de cruz de madeira. As armas são modernas e às vezes as guerras são químicas. Irlanda do Sul e Irlanda do Norte passaram bons pares dos últimos anos matando e sofrendo baixas. Nesse caso a explicação lógica era o conflito religioso, mas com a estampa inegável dos interesses políticos. Assim como lá e em diferentes fases da história.

O comunismo e o capitalismo em suas variadas configurações também envolveram nos embates os apegos materiais de uns e os espirituais de outros. E dirão, alguns analistas, que este conflito nada teve a ver com a fé. Mas ela foi em significativos momentos a grandeza que gerou discordâncias porque do bom ou mau uso dela é que se formulavam os preceitos da economia e da política.

Especialmente no Brasil temos nesta exata etapa de nossas vidas a guerra que põe no lixo toda a nossa base cultural, onde entram a fé e a religião, a democracia e a política, a educação e o respeito para com o próximo e assim por diante. É uma guerra de valores, ou melhor, contra os valores. A permissividade é aceita com naturalidade. A roubalheira é descarada e vista como normalidade. Homens e mulheres participam das missas e dos cultos dominicais e fora dos templos e das igrejas agridem, submetem, ridicularizam, destratam e desprezam. E justificam que foi em defesa própria.

Sim, defesa própria. Aquele homem, pelo que consta no Livro, não foi torturado e morto porque pego em um ato de defesa própria. Assim consta na Escritura Sagrada: ele foi chicoteado, caminhou com a pesada cruz no ombro, foi pregado a ela e morreu, deixando aquelas palavras que devemos, dois mil anos depois, lembrar diariamente para conhecer o seu real significado: “Pai, por que me abandonaste?”

(Walter Ogama)

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