segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Favela da Rocinha, uma operação anunciada

Nem um tiro, comemora a polícia após a invasão da Favela da Rocinha, no Rio, domingo, em operação conjunta com o Exército. Ótimo! O sucesso de qualquer ação dessa natureza se mede pelo objetivo cumprido: tomar a Rocinha das mãos dos bandidos. E quanto menos baixas houver em todos os lados envolvidos no conflito, melhor. O objetivo não era um derramamento de sangue. Ou estamos enganados?

Do ponto de vista oficial instala-se naquela área, a partir de agora, a condição necessária para o convívio harmonioso, de paz, oportunidades e qualidade de vida para as famílias da Rocinha. Quem é que não gosta de viver no sossego, tendo um bom emprego, renda para a alimentação e outras necessidades básicas, possibilidade de finalmente trabalhar um projeto de vida e, principalmente, sem ter que se esgueirar pelas ruelas para fugir dos tiros cruzados?

Existia na Rocinha uma espécie de Estado Paralelo. Era Nem, batizado Antônio Francisco Bonfim Lopes, que governava o local. E há, inclusive, depoimentos de moradores que apreciavam aquela maneira de Nem governar. Um depoimento publicado na Folha de Londrina, em matéria distribuída por agências de notícias, dá conta disso: “O Nem pagava o aluguel de quem precisava, dava cesta básica, ajudava as creches”.

É neste ponto que se escancara a omissão mais cruel do Estado Oficial. A ausência dele tornou famílias inteiras simpatizantes de criminosos. A ausência dele fez, conforme depoimento do próprio Nem após a sua prisão, boa da polícia desonesta. A ausência do Estado Oficial provocou uma inversão de valores: se o Estado Oficial não faz, o Estado Paralelo quebra o galho.

E se o Estado Paralelo pagava aluguel, dava cesta básica e ajudava creches, também, em troca disso e do silêncio de muitas famílias da Rocinha matou com tiros ou pelo vício das drogas milhares de brasileiros. É de se supor, inclusive, que não só policiais, mas também políticos, entraram no esquema financeiro daquele Estado Paralelo.

A Rede Globo, mais uma vez, participou da invasão como personagem oficial da história. O que a Globo anunciou por mais de uma semana antes da invasão, com certeza o próprio Nem e seus capangas sabiam muito antes. Nem, aliás, fez um churrasco de despedido da comunidade em outubro. Esse papel da Globo pelo menos serviu para preparar o terreno e promover a operação do jeito que ela mesma anunciou, em seguida ao fato, com entusiasmo: nem um tiro.

Parabéns! Este objetivo foi cumprido: nem um tiro. E agora cabe a ela, não como assessora do Estado Oficial, assumir a postura de meio de comunicação e promover a dignidade das famílias da Rocinha que foram reduzidas a quase zero devido ao domínio dos bandidos.

E isso se faz cobrando o governo. Denunciando desemprego, miséria, fome, falta de escola, péssimo atendimento de saúde e, principalmente, a ausência do Estado Oficial em todas as etapas da vida de populações que são obrigadas a recorrer a ajuda de criminosos. A Vênus Platinada tem que fazer jornalismo mostrando que o seu interesse não era o de somente gravar imagens dos tanques do Exército entrando na Rocinha. Imagens que, aliás, serão muito bem usadas em campanhas eleitorais.

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