quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Artigo – É como um calo no meio da cabeça

Walter Ogama -  Feito o lápis que marca o lado externo do dedo indicador bem onde existe a segunda dobra a partir da unha, ela deixa sinais que de repente viram feridas e nunca cicatrizam. Às vezes a ponta do lápis é grossa. O grafite parece uma cera teimosa. Os rabiscos não saem. Fica apenas uma sombra no papel, acinzentada, opaca, grossa. Ainda assim o que se vê ali transmite algum tipo de mensagem.

A insistência é fatal. Mais riscos e letras desenhados. Depois palavras, frases e algum texto. A pele do indicador engrossa. O corpo de madeira que envolve o grafite faz pressão também no polegar, naquele ponto que se usa para tirar a impressão digital. E a pele grossa vira calo.

Calos se cultivam. Há quem as use como um atestado. Quanto mais calos, mais enxadões puxados. Mãos lisas e macias podem ser sinônimo de não fazer nada. Concepção injusta? Depende.

Na roça isso sempre foi verdade. Assim como é entre os garis, os coletores de lixo, os que usam as mãos como alavanca para suspender alguma coisa, pás para transportar objetos, pegadores de pingentes para sustentar o corpo nas viagens diárias de idas e voltas em ônibus lotados.

A ética é como o lápis. É um livre arbítrio, uma decisão individual. Usa-se o lápis quando extremamente necessário quando a opção é tecnológica. Então o teclado desenha letras e formam palavras no monitor. Ou faz-se uso do lápis como um complemento do bolso da camisa. Ela vai servir durante o dia para esboçar alguma coisa. No mínimo anota-se com ela um telefone que vai gerar uma comunicação importante. Ou, pelo menos, um recado animador.

É assim também com a ética. Ela pode ser mantida num quadro pendurado na parede. Ou dentro de uma agenda convencional, de papel encadernado. Na era tecnológica, reserva-se um arquivo na memória do computador. E recorre-se a ela quando preciso. Numa versão mais corrente, quando eu sou vítima da falta de ética. Porque pouco interessa eu deixar de ser ético. Mentira? Atire a pedra agora.

A comunicação é um ofício cujo artesão trabalha sentado na mola mestra que a impulsiona. Há quem se ajeite nela e se sinta confortável em todos os instantes. Há quem se agite com freqüência quando num giro brusco da cadeira improvisada ela torture e exija reposicionamentos.

A ética na comunicação não é um calo na bunda. É um calo no cérebro.  

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