quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Crônica - O meio é a mensagem, mas nem sempre

(cuidado: contém cenas explicitas de ironia e sacanagem)

Walter Ogama – Minha colega psicóloga telefona às nove da noite e dá à voz um tom de expectativa e súplica:

- Querido! Preciso de uma ajuda urgente.

- Aconteceu alguma coisa? Está tudo bem com você?

- Tudo...

As reticências são fatais. Imagino que lá vem bomba e decido entrar de sola:

- Então diga. O que é tão urgente?

- Tenho uma palestra para casais amanhã cedo.

- Ótimo! Significa que você é uma referência no tema.

- É, mas preciso de um texto seu, aquilo que você chama de crônica.

- Obrigado pela referência e por ter se lembrado de mim agora à noite. Mas tudo bem, tenho uma madrugada inteira para fazer isso que eu chamo de crônica.

- Querido, não briga. Surgiu de última hora. E quanto a eu não saber os gêneros e os estilos literários você me desculpe...

- Certo, desculpa aceita. Manda o tema, o público alvo inclusive tendência religiosa, faixa etária etc. Manda agora, por e-mail. Estou conectado.

- É simples. Anota ai e nem envio mensagem: casais de um grupo de igreja, faixa de 30 a 40 anos. Enfoque aquela fase em que os desgastes começam a ficar ásperos na relação conjugal.

- Ok. Mando daqui a pouco.

- Mas tem que ser algo forte. Bem suí generís, do jeito que você escreve quando quer provocar...

Desliguei o celular e entrei no Google. Na barra de pesquisa digitei: “casais safados”. Entrou um monte de sites sobre trocas de casais, mulheres casadas em busca de relacionamento extraconjugal, vizinhas atraentes, maduras com corpinho de ninfetas e assim por diante.

Ah, não neguem senhores. A maioria de vocês já entrou nesses sites. Estou mentindo? Eu escolhi um que me parecia mais apropriado. Cliquei e dei aquele tempo para os spans invadirem a tela com anúncios apropriados à ocasião: “Aumente o seu pênis em 3 cm sem cirurgia...”

Na página inicial cliquei na categoria “amadores” e busquei filmes. Lá adiante, depois de uns 15 minutos, achei um vídeo com título sugestivo: “Casal faz sexo anal e filma tudo”. Vamos lá...

A filmagem foi feita provavelmengte com uma câmera digital. O ambiente é escuro. A cena, de cerca de 4 minutos, é única, de continuidade. Aparecem as nádegas da mulher e atrás o marido, com a cabeça cortada. Claro, os rostos são cortados já no enquadramento. O som, embora precário, deixa audível a conversa de ambiente. Ela grita: “Putaquepariu... Estou gozando direto...” Ele responde: “Tá vendo, minha filha. É técnica... é técnica...”

Bastou. Baixei o vídeo, anexei no e-mail e mandei o seguinte recado para a minha colega:

- Colega! Abra a sua fala dizendo que a rotina acentua asperezas que estão presentes na vida a dois. E que há opções diversas para fugir dessa rotina. O casal pode reformar a casa, refazer o jardim, trocar a mesa da sala de jantar, comprar um novo sofá, financiar um carro zero, assinar tevê a cabo ou... Capriche nesse “ou”. Faça uma pausa para abrir expectativa. Encare o público girando o olhar de um lado a outro. Mantenha expressão de firmeza e conclua: ...ou assistam este vídeo e depois a gente conversa. Depois do vídeo faça de conta que não aconteceu nada de extraordinário. Caminhe com desenvoltura de um lado a outro e diga: Perceberam como a comunicação coloquial é perigosa quando se busca sair da rotina? O cara chama a mulher de filha. Ele podia melhorar o clima chamando-a de ordinária. Ai sim a fantasia chegaria à plenitude. Pronto, colega. Dê bom dia, recolhe os seus equipamentos e se mande...

Tomei todo este espaço só para introduzir um desfecho: O meio nem sempre é a mensagem, sou obrigado a discordar do grande Marshall McLuhan. Até que ponto a internet é um meio quente? Por que esquenta quando se acessa um site de sacanagem? Por que atualiza os acontecimentos de A Fazenda ou do BBB? Por que mantém as pessoas conectadas através das redes sociais?

Tudo o que foi citado acima tem um pouco de verdade, em proporção idêntica às mentiras. Porque nada se comprova, não há como medir preferenciais virtuais com os sistemas predominantes. Bruno Mazzeo, por exemplo, já descobriu que a cada ataque contra Luan Santana aumenta extraordinariamente a estatística de seguidores. Mas ninguém comprova a ele, cientificamente, se estes seguidores são simpatizantes ou raivosos.

Na comunicação, principalmente quando se trata de jornalismo, a internet vai mostrando que o meio é frio, apesar de permitir atualizações rápidas. O acesso é de pessoas que se conectam com uma finalidade definida: notícia atualizada de determinado assunto. É coisa pontual, não é site de passagem obrigatória. Os jornais impressos que desprezaram o conteúdo em função desse meio já estão na hora de um retorno inteligente ao passado. Reforço: sair da burrice com inteligência máxima. Meio termo naõ leva a nada.

Nenhum comentário: