O seu colega da pauta já fez uma primeira triagem de todos os acontecimentos. Alguns não podem ficar de fora, pois são continuidade de temas que já foram noticiados e exigem atualizações. E foram mais pentes finos, alguns derrubados pelos próprios jornalistas de sucursais e correspondências. Mas sobram ainda 30 assuntos.
Desse total há temas que recebem uma espécie de indicação. É o gerente comercial que atende determinado município e diz que não está forçando a barra, mas a matéria é recomendável. Ou aquele prefeito amigo do superintendente do jornal. Ele telefona para o editor e diz que tem um acontecimento importante em sua cidade.
Aliás, tão importante que até convidou o dono do seu jornal para integrar a mesa de honra da solenidade. Ao fazer uma checagem, a pauta e o editor de Região descobrem que o tal acontecimento é a assinatura de um convênio para produzir leite de soja. Aliás, mais leite de soja, que na sua forma natural é intragável e arranca caretas dos estudantes que são obrigados a tomá-lo na merenda.
E de repente aquele correspondente resolve se engraçar e manda um e- mail quase intimador: “Caro colega editor. Estou mandando matéria sobre a reunião do prefeito com um grupo de empresários para discutir a cor da fachada do novo shopping. Vai um texto abre de 30 linhas, uma retranca de apoio de 15 linhas e um quadro com a cronologia da construção do shopping. É importante que a matéria saia, pois este prefeito é nosso parceiro”.
Parceiro? Que equívoco o desse correspondente, que até segunda ordem é um jornalista. Se o prefeito mantém contrato publicitário com o jornal, ele é um cliente. Jornalismo não tem parceiro. Pelo menos em teoria é assim que funciona. Mas vamos adiante: e chega a assessoria de imprensa daquela outra prefeitura com um telefonema para o editor: “Mandamos uma sugestões ai pra vocês. Tem uns assuntos importantes”.
Por desencargo de consciência vai lá o editor checar os e-maisl. São uns 20 releases, dos quais a maioria trata de reuniãozinha de não sei o que, quermesse daqui a dois meses, plantio de mudinha de árvore e essas coisas tão caseiras que um jornal de abrangência estadual jamais poderia divulgar.
Na ótica do editor a grande matéria da edição está lá fora, com as comunidades que nem sempre podem comprar um jornal. Mas comunidades que geram assuntos interessantes através de projetos sociais, esportivos, culturais e assim por diante. Matérias que podem dar abre de página e disputar a manchete de capa. Mas como?
É realmente um tormento o dia a dia de quem faz jornal. Pressões são disparadas de todos os lados. E chega o momento em que o editor e sua equipe são obrigados a parar, respirar, recuperar a serenidade e refletir. Nessa hora o melhor que há a fazer é se perguntar: “Quais assuntos que temos são de interessa de um maior número de pessoas deste nosso Estado, sejam elas leitoras ou não?”
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