O primeiro impacto foi na disciplina de elementos de cinema e teatro. Aula numa das salas do Centro de Ciências Humanas, daquelas com jeito de teatro. Aquilo era diferente para alguém que passou anos de estudos em estruturas convencionais no antigo Grupo Escolar Nilo Peçanha e depois se submeteu aos professores do Marcelino Champagnat, do Vicente Rijo, do Ipolon e do Colégio São Paulo.
Chega o professor Robério e apresenta-se como primo do Caetano Veloso. Magérrimo, senta-se sobre a mesa e cruza as pernas de um jeito esquisito. Pega a caneta com delicadeza, pressionando-o com o polegar e indicador. Na platéia, cerca de quarenta jovens boquiabertos. Metade era da turma de relações públicas e metade de jornalismo.
A princípio, daquela gente, quem era homem era homem. Mulher era mulher. A discussão de gêneros ainda era precária. Por isso o professor impactou, mas a única reação da galera foi ficar calada.
Só depois, no intervalo, alguns bochichos ganharam força. Primeiro pelo fato de ter um professor primo do Caetano e da Bethânia. Segundo pelos exercícios práticos que ex-colegiais que nem podiam se levantar de suas carteiras durante as aulas tiveram que fazer.
Um dia o professor pediu a todos que trouxessem lençóis na aula seguinte. Pedido atendido. O exercício foi o seguinte: quatro colegas seguravam o lençol e um se deitava sobre ele. Os quatros abanavam o lençol e arremessavam o contado para cima. Se o arremessado se segurava no lençol era acusado de não confiar na equipe. Mas, sem segurar, alguns eram lançados até lá em cima, perto do teto.
Em outra disciplina, um grupo de alunos ficavam sentados de costas, formando uma fila. Os outros alunos tinham que passar pelo meio, pressionados pelos costas dos colegas. O objetivo era para ter a sensação do nascimento ao simular a passagem apertada pela vagina.
Certa vez trataram da comunicação das plantas. E na sala de aula a professora disse que o arroz, mesmo após feito o cozimento, permanecia viva. E só morria quando ia ser comida. Deu remorso. Por um bom tempo a maioria dos alunos almoçou e jantou pão.
Depois trouxeram Marshall McLuhan. E esse infernizou no cafezinho, nos corredores, banheiros masculino e feminino com o seu O Meio é a Mensagem. O professor pediu para a turma ser separada em dois grupos: um pró McLuhan e outro contra.
Aleatoriamente. No grupo a favor tinha quem era contra e no grupo contra tinha quem era a favor. Num debate aquilo virou uma farofa: alunos do grupo contrário defendiam o autor e alunos do grupo favorável se manifestavam contra, tornando a discussão confusa e gerando brigas entre os participantes.
Na disciplina de televisão o laboratório dispunha de um monitor e duas câmeras precárias. O professor ensinou como era possível simular com as duas câmeras um disco voador rondando os céus do campus da UEL. Uma câmera girando no céu e outra filmando um recorte de papel parecido com um disco. No monitor preto e branco parecia uma mosca silenciosa enchendo as paciências dos telespectadores.
Mais dos que os livros que tivemos que ler e resumir, estas atipicidades é que realmente ensinaram. Deu conteúdo porque gerou indagações e debates, além de indignações. Um colega criou o maior caso com uma professora porque se recusou a participar da brincadeira do lenço atrás. Ele teria que repetir uma colega pela sala dizendo: quem tem põe, quem não tem tira...”
Quase no fim do curso apareceu um tal de Romélio, também professor. Um dia ele me chamou no corredor e disse que seria obrigado a levar um texto que eu havia escrito para a reitoria, pois o conteúdo era comunista. Eu, que de comunismo só tinha conhecimento teórico, fiquei assustado. Logo em seguida uma professora pediu numa prova um comentário. Fiz. A avaliação dela foi de que prova não era para ficar papagaiando.
Claro que valeu. Onde é que um estudante teria pela frente tantos fatos inusitados? Tudo isso, na época do acontecimento, apenas criaram piadas. Mas depois, no pinçar das lembranças, a gente avalia que ensinaram se não de uma forma, de outra que não estávamos habituados (texto de Walter Ogama).
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