segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Opinião - Se tiver mais qualidade dá mais leitura

Jornal é para ser lido, disso dona Elisete tem certeza. Aliás, absoluta. Diarista, esta mulher de seus cinquenta e poucos anos chega cedo ao local de trabalho, num condomínio residencial da Rua Professor Samuel Moura, em Londrina, bem em frente de onde uma construtora de prestigio começa a apontar para a vertical mais um conjunto de apartamentos de luxo.

A primeira tarefa dela é recolher na portaria os exemplares da Folha de Londrina e do JL. E enquanto a patroa acorda, Elisete, lá embaixo no saguão de espera, folheia os jornais. Semana passada iniciei uma sondagem de curioso, para saber o que mais atraia a mulher nas páginas das duas publicações. Preconceituoso e sacana, imaginei que fosse o horóscopo ou a programação da TV, principalmente as dicas sobre os capítulos das novelas.

E me dei mal. Elisete concluiu o antigo ginasial e me disse, desafiadora, que no tempo dela o ginásio valia o colegial de tão rigorosos que eram os professores. Ponderei que o tempo dela era o meu e por isso eu concordava. Então ela acrescentou, como se tivesse lido a minha cabeça: “Aposto que você pensou que eu ia nos jornais só para ver os capítulos das novelas?”

A danada me desarmou. Então recorri à brincadeira: “Claro que não. Eu imaginei que a senhora corria na página do horóscopo. Mulher é chegadinha em horóscopo, vai negar?”

Olha, não foi um murro que recebi na cara, mas doeu tanto quanto. “Como pode você sendo jornalista achar que toda mulher abre jornal para conferir horóscopo e capítulo de novela? A primeira coisa que eu vejo são as cartas. Gosto de saber sobre o que as pessoas reclamam. Tem uns manjadinhos que aparecem nas cartas quase todos os dias, mas por outro lado tem gente de idéia boa que escreve...”

E não deixou mais eu falar. Indefeso, decidi que o melhor era escutar. Ouvi muito e tive a oportunidade de fazer daquele começo de dia uma espécie de evento importante. Sim, muito importante saber que se pode encontrar cultura em gente que não faz questão nenhuma de mostrar ser culta. Elisete discute comigo quase todas as manhãs as manchetes de capa dos jornais. Não temos tempo de prosseguir folheando as páginas, porque ela sobe para o apartamento onde faz a faxina e eu sigo para o meu trabalho fora do prédio.

Eu saio feliz. Pois ao contrário do que pensam inclusive alguns projetistas editoriais, jornal impresso é, sim, lido quando tem em suas páginas o que ser lido. Elisete odeia BBB, A Fazenda, sertanejo universitário, Gugu, Faustão, Luciano nariz grande e sua porta da esperança. Mas garante que respeita quem aprecia “esse tipo de coisa sensacionalista”. E diz mais: “Não perco o meu tempo assistindo o Fantástico. Televisão, em casa, é só para enfeitar a sala. Prefiro ler durante os meus descansos, mesmo que seja um jornal da semana passada...”

Por Walter Ogama

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